Na Oficina Convivência Criativa, organizada na Associação São Joaquim por Eleonora Sampaio Caselato, a feitura do sabão caseiro se mostrou um potente exercício de convivência. A atividade reuniu lembranças, memórias de infância, gestos aprendidos com mães, avós e vizinhas, além de muita curiosidade e desejo de aprender. Em roda, cada participante trouxe sua história, despertando vivências e ressignificando e construindo novas memórias.
A proposta permitiu o resgate de lembranças profundas. “A música de hoje me fez lembrar que eu levava a trouxa de roupa na cabeça para lavar no rio, com sabão caseiro”, recordou Maria do Carmo Onofre Araújo. “Lavei muita roupa no rio… Batia a roupa na tábua grande. Com 13 anos fazia tudo isso”, contou Deusnira Cardoso de Almeida . Para algumas, o processo despertou memórias do interior, da roça, da família reunida, das brincadeiras enquanto as mães trabalhavam. “Quando eu era criança ia com minha mãe lavar roupa no riacho… Eu gostava muito, era divertido”, relatou Benilde Rodrigues de Souza.
A convivência afetiva se fortaleceu quando os relatos cruzaram tempos e trajetórias. Cada participante reconhecia em si um pedaço da história da outra. Para muitas, o sabão caseiro seguia importante na rotina: “Não consigo ficar sem o sabão caseiro”, afirmou Lúcia Helena Morata.
Houve também quem se emocionou com a chance de voltar a mexer a mistura depois de décadas: “Fiquei muito ansiosa… Fazia uns 40 anos que não fazia sabão. Fiquei muito contente de poder ajudar”, disse Cleuza dos Santos Podadera, revelando também a importância de contribuir socialmente nesta fase da vida. Entre tantas vozes, o grupo escolheu até um nome afetivo: Maritacas da São Joaquim, porque “quando nos juntamos é tanta conversa que comparamos com as maritacas nas árvores”, brincou Maria Carlinda da Silva.
No terreno sensível das relações humanas, o sabão foi o pretexto. O verdadeiro acontecimento estava nas entrelinhas: nos olhos brilhando ao reconhecer o próprio valor, no sorriso que surgia quando uma lembrança era acolhida, no pertencimento que nascia do simples estar junto. Ali, onde as mãos misturam soda, cinza e gordura, também se misturam histórias, tempos, afetos. Como um sabão que “clareia” a roupa ao sol, a convivência clareia a alma: esfrega, enxágua, faz espuma de alegria e deixa brilho de autoestima. É nesse espaço simbólico que a solidão se desfaz e deixa de ser um risco para a saúde, um exemplo de que a prescrição social é realmente uma tendência que faz sentido, como preconiza a Organização Mundial de Saúde (OMS). A vivência revelou a potência dos encontros que reavivam a dignidade e a beleza de compartilhar histórias e saberes.
Para a Associação São Joaquim, que tem na Participação Social, no Direito de Ser e Cidadania seu eixo central, a oficina reafirma que criar espaços onde as pessoas idosas possam expressar suas histórias, reconhecer suas potências e fortalecer vínculos, ilumina a jornada. Como sintetizou Valdenice de Souza Menezes ao olhar para o grupo: “As maritacas da árvore, estão todas aqui, no meu coração” .
O sabão produzido será usado para limpar panelas, roupas e utensílios. No entanto, o mais marcante foi a experiência que ficou — essa não se mede com precisão, não se guarda em barras. Ela se espalha, perfuma os dias e reafirma a certeza de que, quando alguém é ouvido, respeitado e reconhecido, alguma coisa importante se lava por dentro.

