Por Mônica Rosales
De onde vem a saúde e como ela pode ser fortalecida? As pessoas estão vivendo mais, no entanto não estão necessariamente saudáveis para aproveitar o lado bom de conquistar mais anos de vida.
Segundo a médica alemã Dra Michaela Gloeckler, pesquisadora da salutogênese, nos aproximamos de uma sociedade onde apenas 20% da população estará ativa, enquanto 80% dependerá da assistência social. Isso nos coloca em um desafio de como inverter esta relação, na qual 80% da população deveria ser ativa e saudável para cuidar dos outros 20%.
Salutogênese significa “Origem da saúde”, portanto seu foco é na prevenção. É a aptidão do indivíduo para viver com qualidade, resistir aos males, movido por um senso de coerência e outros valores subjetivos positivos. A ideia é enfrentar a vida em situações adversas e ainda assim tornar-se flexível, interior e exteriormente.
Isso levanta o questionamento sobre de onde vem a saúde e como ela pode ser fortalecida. Um assunto que deveria estar cada vez mais em pauta. Como podemos, para além das vacinas, criar resistência interna? É justamente esse o paradigma da salutogênese, que busca a gênese da saúde dentro de uma visão integral do ser humano. A salutogênese tem sido tema de pesquisa, inclusive econômica, desde o fim do século XX.
Apesar das vicissitudes da vida, conseguir manter um olhar vivo e um sorriso no rosto, mostra onde reside um segredo para uma vida equilibrada. É no agir cotidiano que devem estar imbuídos propósitos maiores, já que a perda de conexão com o sentido da existência é um fator desintegrador. Estar sadio é estar inteiro, íntegro!
Para isso, é preciso manter o sentido de coerência interna. Desde a infância, a criança deve aprender que o mundo deve ser compreendido, que ele é significativo e valioso, e que pode ser manejado. A convivência com os mais velhos, que passaram por situações duras e que mesmo assim parecem estar de bem com a vida, é talvez uma das maiores fontes de aprendizado. Pessoas idosas que por sua vez tem um sentido de valia e pertencimento no meio em que atuam, certamente tem mais forças de saúde renovadas.
A resiliência é o segundo elemento fundamental. Passar por cima dos desafios da vida e se reerguer novamente. Para além da hereditariedade e do meio, relacionamentos honestos que gerem dignidade, respeito e confiança têm importância central no fortalecimento do corpo e na imunidade. Estudos de qualidade de vida apontam que a capacidade de manter e criar vínculos está entre os maiores patrimônios da vida.
A terceira parte do processo da busca pela salutogênese é a heterostase, que significa estado diferente, e sugere desenvolver a capacidade de adaptação, sempre em um equilíbrio dinâmico. É a habilidade do ser humano de se confrontar com o que lhe é estranho, adaptar-se ao que está fora do seu controle, fortalecendo-se. Reconhecer os limites da resistência física e psíquica e ampliá-los é mais um ponto a favor do equilíbrio.
Por último, deve-se criar força de resistência no campo espiritual. Quando chega o momento de passar a vida a limpo, esta oportunidade deve ser encarada com coragem, ou seja, na esfera do coração, da consciência ética e do amor, onde se torna possível cultivar um relacionamento estável com as forças criadoras.
Para além do que recebemos como atributos, sejam genéticos ou pelo meio em que vivemos, há um convite para desenvolver a saúde, dentro da proposta salutogênica. No âmbito pessoal, dedicar todo dia um pouco de tempo para o autocultivo, como num ócio cultivado, no sentido de nos tornarmos virtuosos, é uma prática milenar, consagrada. No campo social, o espírito salutogênico inspira há anos em várias partes do mundo a promoção e qualidade de vida integral.
A criação de centros comunitários abrangem as três esferas interdisciplinares, NA- CUL-HEAL (Nature, Culture and Heal). A primeira, Natureza, demonstra a dimensão relacional com o meio ambiente total: natureza, pessoas e ecologia humana. A segunda: Cultura, é a promoção de atividades artísticas e culturais, incluindo e valorizando as raízes culturais. A terceira, a Saúde, evidencia a necessidade de atividades de promoção e prevenção da saúde plena.
No Brasil, tem-se notícia de alguns destes programas, implantados com sucesso, sendo o da favela Monte Azul, em São Paulo, reconhecido pela Unesco. A comunidade tem feito um belo caminho de desenvolvimento rumo à uma vida mais digna e com sentido, ainda que em situações adversas.
A Associação São Joaquim de Apoio à Maturidade, em Carapicuíba, São Paulo, também vem construindo um programa coletivo, numa comunidade de pessoas idosas em situação de vulnerabilidade social, que abrange a atuação salutogênica. Em um nível individual, de pessoa para pessoa e com uma mentalidade cooperativa, pessoas que passaram dos 60 anos têm reinventando sua forma de ser e atuar no mundo.
Seria uma utopia? Os contextos micro-sociológicos e a micro-política podem e devem inspirar os 80% da população para fazer a diferença no cenário. Ou se reinventa, ou se padece. Essa é a proposta e o caminho proposto pela salutogênese.
Somos seres criativos e potentes com capacidade de escolher e inventar caminhos de vida. Mas não conseguimos fazer isso sozinhos. Precisamos de uma família, amigos e de uma comunidade que nos incentive e nos apoie de forma que possamos acessar o melhor de nós para nossas vidas e para a sociedade. Só assim somos capazes de colocar mais Vida no Tempo, beneficiando a humanidade como um todo.
Reinventar o envelhecimento é uma necessidade humana, pois ele é parte fundamental do ciclo de vida, que começa quando nascemos. Ele tem perdas, mas também pode ter ganhos se tivermos condições de nos preparar para aproveitá-los. O que você quer fazer com o seu tempo livre e a sua sabedoria quando chegar o momento de se aposentar? Essa construção começa agora.
Mônica Rosales é terapeuta e co-fundadora e idealizadora da Associação São
Joaquim de Apoio à Maturidade.